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terça-feira, 19 de julho de 2011

Delegado da PF fala sobre o operação Trem das Sete em Itaúna

Exclusivo:
Entrevista com Antônio Benício de Castro Cabral
Delegado da Polícia Federal - Divinópolis-MG
 
Por Pepe Chaves*
 
Antônio Benício de Castro Cabral falou com Via Fanzine por e-mail.

O delegado da Polícia Federal, Antônio Benício de Castro Cabral, da unidade de Divinópolis, no Centro-oeste de Minas Gerais, é o responsável pelo inquérito que aponta inúmeras irregularidades no processo de contratação para projeto de transposição de linha férrea pela Prefeitura de Itaúna e o DNIT naquele município. O delegado coordena a Operação Trem das Sete, que tem por objetivo provar a ocorrência de crimes contra a Lei das Licitações e indiciar os responsáveis, a fim de que sejam levados às barras da Justiça Federal. Nessa entrevista gentilmente concedida a Via Fanzine, o doutor Benício confirma a prática de crimes previstos pela Lei de Licitações e aponta ainda a "indícios de envolvimento direto" do prefeito de Itaúna, Eugênio Pinto, nos fatos apurados. Benício também destaca a participação de servidores do DNIT nas fraudes detectadas, e comenta, "É justamente desses fatos que o senhor Luiz Antônio Pagot está sendo acusado, em todas as obras que o DNIT financiou, segundo eu tenho visto na grande mídia". O delegado também afirma que "O nível administrativo encontrado na PMI é muito baixo e extremamente prejudicial a qualquer forma de fiscalização ou auditoria". Benício aponta para a criação de um cartel formado por uma mesma empresa que se passaria por várias, cujo objetivo seria vencer licitações para prestar assessoria em projetos. Quanto ao depoimento de 48 pessoas intimidas, Benício critica o comportamento de alguns dos depoentes lotados na Prefeitura de Itaúna, que se omitiram e não teriam prestado as devidas informações à investigação, devendo ser indiciados por isso. O delegado também alerta à população para saber em quem votar e "condenar" ou "cassar" os maus políticos, sejam prefeitos ou vereadores, através do voto.
 
A entrevista
 
VF – Prezado doutor Benício, a Operação Trem das Sete investiga supostas fraudes em licitação realizada pela Prefeitura de Itaúna para obra de transposição das linhas férreas na cidade. O que poderia nos sintetizar sobre estes trabalhos de investigação coordenados pelo senhor?
Benício – Os vereadores de Itaúna realizaram uma CPI, entre final de 2007 e início de 2008 e descobriram muitas irregularidades nas licitações que se seguiram à assinatura do Convênio DPP/TT 204/205, entre o DNIT e a Prefeitura Municipal de Itaúna (PMI), com interveniência da FCA. Na esteira da contratação da empresa que iria elaborar o Projeto Executivo para transposição da linha férrea, por cerca de R$ 1,9 milhões, foram contratadas mais três empresas, cada uma para dar uma “assessoria” específica. Os vereadores descobriram que essas quatro empresas, assim como outras que se interessaram pela licitação principal pertenciam a um mesmo grupo, ou seja, eram empresas coligadas entre si. Ademais, perceberam que, contrariando a Lei, não houve publicidade na licitação principal, o que impediu que outras empresas participassem. A Prefeitura Municipal de Itaúna (PMI), em vez de tomar providências para apurar os fatos gravíssimos, fez, por assim dizer “vista grossa” e alguns dirigentes municipais ironizaram a investigação dos vereadores. A partir daqueles documentos o Ministério Público instaurou um Inquérito Civil Público, mas teve muita dificuldade para obter toda a documentação necessária, pois a PMI sempre entregava documentação incompleta. O MP requisitou à Polícia Federal a instauração de Inquérito Policial e a partir daí dirigi Representação ao MM. Juiz Federal pedindo Mandados de Busca e Apreensão (MBA), mostrando ao Juiz Federal que a PMI estava dificultando as investigações do MP, em frontal contrariedade à Lei. Apreendemos a documentação necessária, na PMI e nas empresas e assim completamos o cenário. Após a colação da documentação, constituída hoje de 27 volumes, em quase 5.500 folhas, passei a ouvir as pessoas envolvidas nos fatos. Foram realizadas mais de 40 oitivas e esta fase ainda não está terminada.
 
VF – O senhor encontrou alguma resistência ou dificuldade para realizar esta operação policial?
Benício – Não. Não houve resistência. Dificuldades houve várias, como por exemplo a desorganização e incompletude dos processos administrativos da PMI, não cumprimento de formalidades básicas, como falta numeração de documentos, falta de datas em documentos, falta de assinaturas em documentos etc. O nível administrativo encontrado na PMI é muito baixo e extremamente prejudicial a qualquer forma de fiscalização ou auditoria. Também está havendo dificuldades do ponto de vista de que os servidores municipais, com honrosas e heróicas exceções, têm medo de falar a verdade e defender efetivamente os interesses da população de Itaúna. Alguns deles vão responder ação penal por terem participado dos fatos e agora serem omissos e não falarem claramente sobre as irregularidades, que eles sabem que ocorreram e poderiam ajudar a punir os verdadeiros cabeças dos crimes.
 
VF – Que tipo de documentos e dados foram recolhidos pela Polícia Federal na Prefeitura de Itaúna e o que se pretende com estes?
Benício – Documentos que a própria PMI deveria ter enviado aos vereadores e ao MP e não o fez, dos processos de licitação. Documentos que mostram uma troca de mensagens entre a empresa contratada e a PMI, e o DNIT e a PMI, onde são tratadas ações ilícitas, como falsificar datas de documentos oficiais etc. Nas empresas foram apreendidos muitos documentos que provam e comprovam que são todas “irmãs” [as empresas], onde os dirigentes de umas se confundem com os de outras e existem salas compartilhadas, entre empresas que, na licitação, se apresentaram como concorrentes.

'O plano é que o prefeito seja intimado para prestar declarações na
 próxima etapa, quando o inquérito retornar do Ministério Público'
 
VF – Das 48 pessoas indiciadas pelo inquérito federal, quantas ainda faltam depor?
Benício – Não há pessoas indiciadas até a presente data. O indiciamento é um ato formal, onde o Delegado formula uma opinio delicti, que é a sua convicção, em cima das provas e indicia a pessoa, cadastrando seus dados no Sistema Criminal das polícias. Nesta etapa atual foram intimadas 48 pessoas para serem ouvidas. Destas, algumas ainda não foram ouvidas. Adiante, na próxima etapa, deverão ser ouvidas mais cerca de 30 pessoas.
 
VF – Agradecemos por este esclarecimento sobre o indiciamento que ainda deverá ocorrer. Mas, quanto ao prefeito Eugênio Pinto, ele já prestou sua oitiva?
Benício – O prefeito ainda não prestou declarações. O plano é que o prefeito seja intimado para prestar declarações na próxima etapa, quando o inquérito retornar do Ministério Público.
 
VF – Conforme o senhor adiantou à imprensa, as investigações já teriam constatado a prática de crimes nos processos da referida contratação municipal para a transposição das linhas férreas em Itaúna. Porém, faltava ainda, chegar aos responsáveis. Quais seriam estes crimes e, até o presente momento, tais responsabilidades já foram apuradas?
Benício – Os crimes são os da Lei das Licitações (Lei nº 8.666/93), que basicamente tratam de fraudar o caráter competitivo da licitação e inexigir licitação baseado em fundamentação falsa. Ainda que, desde o princípio já havia nomes de destaque nos fatos criminosos, é cedo para se falar em responsabilidades. Quando as condutas de cada um estiverem bem delineadas, iniciarei os indiciamentos.

'(...) O senhor Prefeito agiu de forma muito fleumática quando os vereadores apontaram
as dezenas de irregularidades. São indícios de envolvimento direto nos fatos, até mesmo porque
o senhor Prefeito poderia ter exonerado todos os Secretários que se mostraram desonestos (...)'
 
VF – Para o senhor, quais são as reais responsabilidades do prefeito de Itaúna, Eugênio Pinto, com relação às irregularidades identificadas pelas investigações da Polícia Federal?
Benício – É difícil para qualquer pessoa com um mínimo de racionalidade acreditar que o senhor Prefeito Municipal não teve participação nos fatos, mesmo porque os seus principais homens (e mulheres) de confiança são os principais responsáveis pelos fatos em apuração. Ademais, houve uma convergência de informações dos declarantes de que a licitação em questão ficou concentrada nas mãos do Prefeito e de uns poucos Secretários de máxima confiança, especialmente aqueles que o público começou a chamar de “Grupo de Ipatinga”. Também se percebe que o senhor Prefeito agiu de forma muito fleumática quando os vereadores apontaram as dezenas de irregularidades. São indícios de envolvimento direto nos fatos, até mesmo porque o senhor Prefeito poderia ter exonerado todos os Secretários que se mostraram desonestos, ou claudicantes, desde o primeiro fato levantado.
 
VF – A princípio, foi divulgado pela imprensa, inclusive a nível nacional, que as irregularidades possivelmente envolveriam também servidores do DNIT. O que o senhor confirma essa informação? O que pode nos falar a respeito?
Benício – Os dirigentes do DNIT agiram muito mal na condução do processo, logo após a contratação da empresa. Ficou evidente, desde os primeiros atos, que havia centenas de irregularidades e mesmo assim os dirigentes do DNIT permitiram que o Convênio fosse sendo prorrogado, de forma irregular e contrariando a legislação que trata das verbas federais. O DNIT sabia que a empresa contratada era a mesma que havia feito um “Estudo Prévio” para a Prefeitura, o que a tornava suspeita para participar da licitação. Os dirigentes do DNIT também aceitaram aumentar o valor do contrato, sem razões plausíveis. E é justamente desses fatos que o senhor Luiz Antônio Pagot está sendo acusado, em todas as obras que o DNIT financiou, segundo eu tenho visto na grande mídia. Em vez da Prefeitura ser punida por não cumprir sua parte, ganhou de prêmio um aumento no valor, para repassar à empresa contratada, que levou cinco anos para não concluir um trabalho que deveria durar sete meses, se houvesse seriedade. Esse absurdo foi autorizado pelos dirigentes do DNIT. O que se percebe, comparando com as denúncias da revista VEJA e da grande imprensa, é que os dirigentes do DNIT fizeram em Itaúna o mesmo que eles são useiros e vezeiros de fazer em outras obras financiadas com dinheiro federal. Entre as alegações da empresa para aumentar o valor está a alteração do Traçado Sul para o Traçado Norte. Ocorre que a UFMG já havia feito um estudo declarando que o melhor traçado para Itaúna é o Norte. Sendo assim, houve uma simulação de que o Traçado Sul era melhor, justamente para depois pedir a alteração e o aumento de preço.

'O papel [dos vereadores] é FISCALIZAR e se necessário CASSAR o Prefeito
e não ficar fazendo salamaleques para o Prefeito, como tem sido comum nesse sofrido Brasil'
 
VF – Qual é a previsão para encerramento do inquérito e qual será o procedimento que será adotado por essa unidade de Polícia Federal, após sua conclusão?
Benício – A previsão otimista é encerrar (lavrar o Relatório Conclusivo) até o final deste ano. O Relatório Conclusivo apresenta todas as condutas praticadas por cada indiciado e busca convencer o Ministério Público de que aquelas pessoas precisam ser condenadas na Justiça Federal.
 
VF – Grande parte da sociedade itaunense está ansiosa para saber o resultado dessas investigações, vez que a atual administração municipal responde também a outras graves denúncias, incluindo seguidas Ações Civis Públicas por parte do MPE, denunciando irregularidades e abusos diversos. Como responsável pela apuração de supostos desvios de recursos públicos do nosso município, o que o senhor poderia colocar para o povo de Itaúna nesse instante?
Benício – Como cidadão brasileiro eu gostaria muito que os criminosos que descumpriram a lei sejam prontamente condenados a penas fortes, que tenham caráter educacional e dissuasório, para que estes nunca mais pratiquem atos criminosos e os que serão eleitos no futuro também não pensem em fazê-lo, mesmo quando grandes empresários corruptos ofereçam oportunidades de desviar dinheiro público, como foi o caso.
 
VF - Agradecemos imensamente pela entrevista e pedimos para nos deixar suas considerações finais.
Benício – O processo penal e o Juiz têm que ser muito cuidadosos, para não condenar pessoas inocentes. Por isso o processo penal tende a ser demorado. Então, em política, é melhor a população condenar diretamente, ou seja, nunca mais dar um único voto em político que pratica atos suspeitos. Como diziam os antigos romanos, “não basta que a mulher de César seja honesta, é preciso que ela pareça honesta”, ou seja, o político, principalmente o Prefeito Municipal, tem que ter uma atitude limpa, coerente e ascética em tudo o que ele faz. Se houver uma mínima suspeita contra algum Secretário ou servidor, ele tem que tomar atitudes imediatas e firmes, para mostrar para o público sua honestidade. Se não for assim, os eleitores devem votar em outro candidato, da próxima vez. Isso vale também para os vereadores, cujo principal papel é FISCALIZAR e se necessário CASSAR o Prefeito e não ficar fazendo salamaleques para o Prefeito, como tem sido comum nesse sofrido Brasil. É o que eu acredito.
 
* Pepe Chaves é editor do diário digital ViaFanzine e da Rede VF.
 
- Imagem: Reprodução.
 

2 comentários:

OBSERVADOR disse...

Gostei disso:

"Alguns deles vão responder ação penal por terem participado dos fatos e agora serem omissos e não falarem claramente sobre as irregularidades, que eles sabem que ocorreram e poderiam ajudar a punir os verdadeiros cabeças dos crimes."

Em BD tem vereador que vai se enrolar pra explicar o inexplicável...

Anônimo disse...

na proxima eleição,com certeza no minimo 7 vereadores desses ai não vão ser reeleitos, claro; se os eleitores daqui colocarem a mente para lembrar.... tomara que não venha aquele ditado que "O POVO MERECE O GOVERNO QUE TEM" senão bom despacho vai ficar para traz denovo.

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