Quanto à presunção da inocência, o raciocínio não fecha.
No Brasil há muitas atividades vedadas àqueles que respondem a processos. Isso, mesmo sem nenhuma condenação. Por exemplo, que banco contratará um segurança que responde a um processo por assalto a banco? Que seguradora contratará um gerente processado por desfalque?
Aliás, a lei permite até mesmo a prisão sem condenação. É o caso, por exemplo, das prisões provisórias e preventivas.
Em nenhum desses caso se diz que há ofensa à presunção da inocência. Por que haveria ao se aplicar regra igual a um político condenado em duas instâncias?
Quanto à irretroatividade, a lógica é mais frágil ainda.
Um político condenado por improbidade administrativa é um político condenado. Por que não pode o povo brasileiro exigir que ele fique afastado das urnas por oito anos? Claro que pode. E é o que faz a Lei da Ficha Limpa: explicita que a probidade é um pré-requisito para a candidatura. Se é pré-requisito, não é pena. Portanto, não se pode falar em retroatividade.
Nesse sentido, o trecho abaixo, extraído do voto do Ministro Joaquim Barbosa, mata a cobra e mostra o pau:
Inicialmente, relembro a conhecida afirmação de que
“inelegibilidade não é pena”, ou seja, de que as hipóteses que tornam o
indivíduo inelegível não são punições engendradas por um regime
totalitário, mas sim distinções, baseadas em critérios objetivos, que
traduzem a repulsa de toda a sociedade a certos comportamentos
bastante comuns no mundo da política. Os que adotam esses
comportamentos não podem, obviamente, ter pretensão legítima a
ascender à condição de representante do povo. Porque não são penas, as
inelegibilidades não guardam pertinência com o princípio da presunção
de inocência, isto é, não exigem, para a sua configuração, que se dê margem a especulações de caráter subjetivo a respeito do fato que as
gerou. A inelegibilidade não constitui uma repercussão prática da culpa
ou do dolo do agente político, mas apenas a reprovação prévia, anterior e
prejudicial às eleições, do comportamento objetivamente descrito como
contrário às normas da organização política.
Por não serem penas, às hipóteses de inelegibilidade não se aplica o
princípio da irretroatividade da lei e, de maneira mais específica, o
princípio da presunção de inocência. A configuração de uma hipótese de
inelegibilidade não é o resultado de um processo judicial no qual o
Estado, titular da persecução penal, procura imputar ao pretenso
candidato a prática de um ato ilícito cometido no passado. As hipóteses
de inelegibilidade partem de um ato ou fato público, notório, de todos
conhecido. Sua configuração é imediata, bastando para tanto a mera previsão legislativa. Não se exige, para que seja considerada
constitucional, o respeito a outros princípios manifestamente associados à
persecução penal, os quais foram inseridos na Constituição com objetivo
de conferir proteção ao mais importante bem da vida, a liberdade
individual de ir e vir. Mesclar princípios pertencentes a searas
constitucionais distintas é, a meu ver, atitude defesa ao juiz
constitucional, sobretudo se o objetivo explícito ou implícito é a conservação das mazelas sócio-políticas que afligem cada país. A jurisdição constitucional não foi concebida com esse intento. Ao contrário,
a jurisdição constitucional tem precisamente entre as suas metas a
extirpação dessas mazelas.
Clique aqui para ver o voto na íntegra.
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